O Homem Invisível || Estreia em 27 de fevereiro de 2020
Crítica por Bárbara Kruczynski
O clássico ‘O Homem Invisível’ (1933), adaptação do livro homônimo de H.G. Wells (1897), acaba de ganhar uma nova roupagem para as telas e utiliza do material original para questionar os tempos atuais, onde relacionamentos abusivos estão sendo expostos e contestados. Como thriller, o longa funciona muito bem e prende a atenção do espectador, como temática para conversas sobre o assunto, a relevância deste se torna ainda mais necessária.
Estrelado pela sempre brilhante Elizabeth Moss (da série de sucesso The Handmade’s Tale), o filme não tem a exata intenção de esmiuçar a origem do personagem título ou celebrar suas descobertas ‘de poderes’, mas sim o de dar voz a quem ele persegue alucinadamente. Logo, o que assistimos é a jornada de uma mulher tentando fugir de um homem controlador e sociopata ao invés de uma introdução exata para o público entender como este último se transformou nesta versão odiosa de si mesmo. Ainda no elenco: Storm Reid, Michael Dorman, Harriet Dyer e Aldis Hodge. A direção é de Leigh Whannell (Sobrenatural: A Origem).
O inicio do filme revela exatamente o que foi dito acima. Cecília (Moss) acorda e se veste rapidamente tentando não acordar o marido Adrian (Jackson-Cohen) e foge logo em seguida buscando somente o necessário para sair o mais rápido possível do lugar. Previamente calculada, a fuga não é tão bem conduzida já que a mulher esbarra em objetos pela casa e, por último, no carro estacionado na garagem e o alarme deste é acionado. O cachorro do casal também tenta ir com ela, o que a atrasa um pouco. Ao pular os muros da mansão isolada, se embrenha pela mata e sua carona demora a chegar, mas chega. Porém, Adrian já estava no encalce dela e tenta a força tirar ela do carro, não conseguindo fazer isso. Tais cenas são feitas com cuidado e não deixam de mostrar o interior da casa e o quão tecnológica ela é. Carros, motos, laboratórios de pesquisa, trajes de teste e até uma coleira automatizada para o canino da família.
Quando Cecília consegue finalmente escapar da relação aterrorizante que vivia, busca asilo na casa de um amigo próximo que também é conhecido de sua irmã Alice (Dyer), o policial James (Hodge). O homem vive com a filha adolescente Sidney (Reid) e não tem a mínima ideia de que ninguém ali está a salvo, pois Adrian não vai deixar a esposa sair tão fácil assim de sua vida. Cecília se mostra altamente transtornada com o que viveu e mal consegue botar os pés fora de casa, ainda que James insista que ela o faça.
Com o passar dos dias, notícias chegam que a mulher não deve mais temer o ex, pois este decidiu deixá-la de vez. O irmão de Adrian, Tom (Dorman), faz questão de a contar o que houve e o que lhe é garantido da relação perante a lei. Contudo, acontecimentos estranhos começam a rondar a casa em que ela está hospedada e não demora para que ela perceba que Adrian está por trás de todos os ocorridos. O que não é nada fácil de dar crédito a ela, pois o homem foi declarado morto e é aí que toda a graça do filme se inicia.
A temática tão atual é bem trabalhada no roteiro quando aquele consegue instituir que a mulher está louca por achar que o marido falecido a está perseguindo e ninguém ao seu redor consegue crer em sua fala. O homem também reforça a loucura da esposa a fazendo parecer 'fora de si' e construindo provas contra ela. O interessante é que ao invés de enganar a audiência, o filme diz que há verdades e mentiras e as entrega ao público com facilidade para que este tenha a capacidade de discernir quem tem ou não culpa no cartório. A direção faz melhor e deixa que as dicas e conveniências informem que somente o ato final trará um julgamento eficaz aos culpados — ainda que este se prolongue um pouco. E a força da personagem de Moss é vista ali, depois de cambalear por inúmeros momentos e ser tão vulnerável.
A produção realmente traz a loucura do ‘Homem Invisível’ no ponto e como aquele acredita ser imbatível evocando somente o que o resultado da busca pela invisibilidade mostrado na trama original e/ou no livro fez com ele — e se alguns de vocês lembrarem, tal história é bem similar a apresentada no filme ‘O Homem Sem Sombra’ (2000), com Kevin Bancon, mas sem real ligação. Moss é perfeita para o papel e consegue construir passo a passo um crescimento simbólico para sua personagem. Pensar que Alexander Skarsgärd e Armie Hammer foram cogitados para o papel antagonista à ela, mas este acabou indo parar nas mãos de Oliver Jackson-Cohen, nos insere a ideia de que o filme é dela e de mais ninguém, já que o estúdio preferiu ter atores menos conhecidos ao seu lado.
Tecnicamente, algo que é emblemático aqui é a trilha sonora. As composições ressoantes não param por nenhum segundo e trabalham a tensão por todo o filme. A cinematografia vem em tons escuros e esverdeados e o suspense não sai de cena. A edição poderia ser um pouquinho mais enxuta, mas a direção compensa o seu prolongamento. O Homem Invisível entra em cartaz como o segundo remake do ‘universo monstro’ da Universal Pictures (o primeiro é, o já esquecido, ‘O Lobisomem’, lançado em 2010) e pode ser que este faça mais filmes do estúdio voltarem as telas renovados.
Avaliação: Quatro trajes obscuros e sangrentos (4/5).
Postar um comentário